Nesse querido ano de 2018 a Marvel mais uma vez surpreendeu a todos ao lançar o seu filme de maior representatividade da MCU. Sem dúvidas, Pantera Negra é um sucesso trazendo consigo grandes questionamentos sociais, provando que um filme de herói pode ser um blockbuster ao mesmo tempo em que não precisa ser necessariamente raso, sem nenhuma reflexão. O Pantera Negra provou que podemos ter as duas coisas, de maneira muito bem feita.
A começar pelo fato da maior parte do elenco ser negra. Sim, isso é fundamental para um filme que procura romper a superficialidade e demonstrar todas as malezas causadas ao negro em toda a história da humanidade. Seria diferente colocar um diretor branco por de trás dos panos. Um negro, uma pessoa que tem que lhe dar com preconceitos em todos os momentos da sua vida tem um conhecimento e é mais capacitado para falar de racismo do que um branco. É diferente você teorizar em cima do racismo do que, por exemplo, ser vítima do racismo. Temos aí um conhecimento empírico contra um conhecimento teórico.
O mesmo fato ocorreu no excelente filme da Mulher Maravilha, o melhor da DC na minha humilde opinião. Era necessário colocar uma mulher na direção para fazer uma obra de representatividade feminina. Um homem talvez pudesse ter outra visão, ou até mesmo outras prioridades, ou talvez estivesse somente interessado em representar os aspectos físicos da protagonista.
O filme do Pantera trabalha basicamente com a ideia da exploração da raça negra na história da humanidade. Esse é o principal mote do vilão, segundo ele Wakanda – por ser a nação mais avançada do planeta – deveria intervir para ajudar a comunidade negra de todos os cantos do mundo e de quebra, ainda dar um troco nos colonizadores. Segundo ele, uma nação poderosa deveria lutar pelos direitos de seus semelhantes, seus irmãos. Cria-se aqui um ideal de luta social, luta por direitos civis.
Por outro lado, os que preferem o isolamento de Wakanda procuram defender somente os seus interesses locais com medo que toda a sua riqueza fosse descoberta pelas outras nações do planeta, que poderiam voltar os seus olhos cobiçosos mais uma vez para o continente negro. Medo de uma espécie de recolonização.
Aqui entra um aspecto interessante que deve ser ressaltado. Não podemos pensar o negro como se fosse uma etnia somente, sendo que existem várias tribos na África das mais diversas etnias, assim como há diversas etnias brancas, asiáticas pelo mundo afora. Pensar o homem negro como se fosse um só seria um pensamento muito reducionista, que simplificaria muito toda a riqueza e diversidade cultural do continente africano. Além de ser um ponto de vista preconceituoso.
O que acaba por prevalecer no final é uma visão mais moderada, equilibrada, longe dos extremos. Mas o enredo é tão bom que o expectador acaba até por simpatizar com o “vilão”, e esse fato se deve também ao carisma de Michael B Jordan.
Não bastasse a representatividade do homem negro, temos também uma forte representatividade feminina. Diria até que há várias protagonistas femininas que dividem o espaço de tela com o Pantera Negra, em até certo ponto roubando seu protagonismo. Ou vai dizer que ninguém achou legal a guarda do rei ser composta por mulheres guerreiras? Sensacional. A figura feminina forte também pode ser percebida na figura de Shuri, uma especialista responsável por toda a tecnologia do traje, dos aparatos do traje e dos avanços científicos de Wakanda. E pela primeira vez temos um herói negro representado na figura de um rei. Longe do estereótipo do bom soldado, do homem do gueto, do morador das regiões periféricas. Temos um rei negro, uma posição superior. Temos aqui mais uma quebra de paradigmas.
A africanidade está 100% inserida nesse filme através de todos os rituais, a disputa entre as diferentes tribos pelo poder, todas as danças, os dialetos, as vestimentas, a tradição. Sensacional. A mistura entre ancestralidade africana e tecnologia avançada de um traço que tornou o universo do Pantera Negra em algo único, distinto. Realmente a equipe se comprometeu com um projeto de representatividade.
A tarefa era difícil, audaciosa, mas foi executada com sucesso.
Cá entre nós, é muito mais fácil trabalhar com o panteão de deuses de uma cultura branca em uma sociedade onde os valores brancos estão bem estabelecidos e são dominantes. O difícil é trabalhar com os valores de uma cultura que é marginalizada, em busca de espaço dentro da sociedade.
E o mais importante, o filme gerou discussões. Não sei ao certo, mas não lembro de nenhum outro filme de herói que tenha abordado questões tão importantes. O objetivo dessa postagem não é discutir, mas sim levantar os pontos positivos de debate do filme, seu legado. Por isso, é importante o debate para evitar ideias radicais, extremistas que propõe soluções rápidas e ineficazes. Então, leve os seus queridos para assistir a esse excelente filme. E depois reflita.
Até a próxima…